Por que as indústrias devem contratar mais doutores, e mais industriais devem fazer doutorado?

A demanda por PhDs nas indústrias vem aumentando sobretudo em razão da forma rápida e radical com que mudanças vêm ocorrendo [1] . As contratações ocorrem não pelo fato de PhDs serem altamente qualificados ou por sua habilidade de absorver conhecimento científico [1, 2]. O interesse das empresas está na capacidade dos PhDs de utilizar poderosos métodos analíticos e estratégias para a entender, formular e resolver problemas complexos [3, 4], e no capital social desenvolvido por esses profissionais durante o processo de doutoramento, que normalmente envolve relacionamento com pesquisadores de diferentes áreas. Isso lhes permite identificar soluções para problemas de diferentes naturezas, detectar oportunidades tecnológicas dentro e fora da empresa e gerenciar parcerias [4] .

A observação dessas tendências e evidências da importância dos PhDs para o sucesso das empresas é um convite para que os executivos industriais reflitam sobre isso. Vale considerar a hipótese que essa capacidade de absorver conhecimento, entender os fatos e resolver problemas, pode ser de grande contribuição não somente nos departamentos de P&D mas também nas áreas de negócios e no próprio “chão-de-fábrica”.

Esse processo de forte interação entre universidade, governo e empresas, conhecido como Tríplice Hélice framework,  é observado em alguns locais de grande avanço econômico e tecnológico, como o Vale do Silício. Nesse novo paradigma, as três hélices: governo, indústria e universidade, atuam sinergicamente, contribuindo com suas competências para objetivos comuns e até assumem, em algumas situações,  uma o papel da outra. Ou seja, a indústria é sempre a hélice envolvida nos negócios e na produção, o governo é a hélice que regula e fomenta as relações, e a universidade é a hélice que produz conhecimento e tecnologia, mas a indústria também produz tecnologia, o governo também se envolve em aspectos de produção e a universidade também influencia as decisões sobre fomento e regulação. Esse estreitamento de relações ainda está em curso mesmo em países de desenvolvimento mais pujante. O fato é que em muitos locais a universidade ainda é vista como uma área periférica de suporte ao desenvolvimento tecnológico [5].

Nesse contexto, quem atua como elemento de conexão entre as hélices é o estudante de PhD. No contexto em que ele é um profissional da indústria em processo de doutoramento, o termo aplicado pela literatura é Industrial PhD Student. Isso porque ele realizará um projeto de pesquisa, que contribua com a indústria em que atua, e que também atenda a todos os critérios para obtenção de um título de doutor, tais como resolver um problema inédito, de forma inovadora, e apresentar prova incontestável da eficácia de sua proposta de solução [6] .

No Brasil, observa-se uma intensificação dessa prática sobretudo após os estabelecimentos dos marcos legais federal e estaduais de inovação, e das políticas de inovação nas universidades. Em alguns casos, as instituições têm criado institutos ou agências de inovação, cujo papel é entender os problemas e os desafios do setor produtivo e do governo e verificar quem e/ou que soluções já propostas pela equipe de pesquisadores da instituição, pode contribuir.

Entre as objeções verificadas por parte dos executivos industriais nas interações com institutos de pesquisa estão a desconfiança a respeito da capacidade das universidades de entregar soluções práticas à indústria e a demanda por respostas rápidas. Mas até essa expectativa a respeito da possibilidade de identificar soluções para problemas complexos em semanas se deve à falta de PhDs nas empresas. Isso porque sem eles, os executivos não dispõem de assessoria capaz de ajudar a definir quais problemas são solucionáveis a partir do uso de métodos, técnicas e tecnologias estabelecidos, e quais outros demandam pesquisa e desenvolvimento. O resultado disso é que a indústria apresenta como “urgentes”, problemas que assim são há décadas, e mesmo assim esperam obter uma solução em semanas.

Felizmente, essas barreiras têm sido transpostas ao passo em que as indústrias começam a empreender projetos em parceria com universidades, mesmo que pequenos, e a partir disso reconhecem os benefícios práticos que essa relação proporciona. Essas interações permitem que as duas “hélices” se conheçam melhor, entendam suas competências, capacidades, deficiências e desafios, criem empatia, e a partir disso contribuam de forma eficaz, uma como desenvolvimento da outra. Sendo assim, verifica-se que a integração entre indústria e universidade está se estabelecendo e ampliando continuamente, e que o PhD é um importante ator nesse processo. Por isso, é importante que as indústrias que ainda não dispõem de doutores em suas equipes reflitam sobre esse ponto e busquem estreitar seus relacionamentos com universidades e institutos de pesquisa.

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